Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
imagem retirada daqui
segredo é um conceito que se faz desejado, que cria uma falsa intimidade (entre quem o partilha); é elitista e alimenta o imaginário.
no caso do estado acredito que o termo informação ou conteúdo confidencial seria menos “apelativo” a controvérsias.
eu confesso que os segredos nunca me interessaram, por achar que ou eram patetices para chamar a atenção e criar curiosidade ou, se são segredos, existem para proteger quem está envolvido – e é de respeitar cada um e a sua intimidade.
a transparência é a forma como vejo que devem ocorrer as relações. no entanto, há coisas que não são ditas. são segredos? muitas vezes não. apenas informação que não é partilhada ou, por alguma razão – muitas vezes por sabedoria, é omitida. mas se surgir a necessidade da partilha dessa informação a mesma deve ser feita de forma honesta e transparente.
isto não me choca – peço desculpas a quem estiver a chocar com esta confissão.
o estado português prevê a existência de seus segredos para se proteger. o contexto e as característica destes estão bem delimitados “são abrangidos pelo segredo de estado os documentos e informações cujo conhecimento por pessoas não autorizadas é suscetível de pôr em risco ou de causar dano à independência nacional, à unidade e integridade do estado e à sua segurança interna e externa.”
se é para nos proteger, enquanto nação, acho bem. se for para proteger que está no poder, não acho bem.
por princípio tenho/quero acreditar que o segredo de estado é invocado obedecendo “aos princípios de excecionalidade, subsidiariedade, necessidade, proporcionalidade, tempestividade, igualdade, justiça e imparcialidade, bem como ao dever de fundamentação”.
pelo que fui percebendo nas leituras que fiz sobre esta matéria o segredo de estado aplica-se, sobretudo, nas relações internacionais e nas questões referentes às forças de defesa nacional.
na minha, humilde, perspetiva a existência da possibilidade do segredo de estado não melindra a liberdade de informação do estado. são situações extraordinárias, enquadráveis na legislação, e que exigem o envolvimento de os órgãos de soberania, logo, parece-me arrogante e uma forma de desacreditação da própria democracia “desconfiar” de todo o processo que envolve a sua invocação.
“nunca fales de ti. guarda ao teu ser o seu segredo. se o abrires nunca o poderás fechar.” fernando pessoa
Se, como diz o povo, que é sempre quem mais sabe destas coisas, o segredo é a alma do negócio, como o negócio é a alma da nossa relação com o Estado, o segredo é a alma da relação entre o Estado e os cidadãos.
Uma relação assim tem tudo para não dar certo. Sabemos bem que a relação perfeita é aquela onde não há segredos. Sempre que queremos demonstrar a solidez de uma relação, seja em que domínio for, não encontramos melhor forma de a expressar que dizer “entre nós não há segredos”.
Tretas. Sabemos que não dizemos isso porque seja rigorosamente verdade. Quando dizemos isso da nossa relação com os nossos filhos, que é excelente porque entre nós não há segredos, sabemos bem que não é assim. Sabemos que nos escondem em segredo tudo o que entendem que não temos nada que saber. Como não é bem assim com a/o nossa/o companheira/o, onde há sempre muita coisa que o melhor, mesmo, é que o outro não saiba. E muito menos com os nossos amigos, se prezarmos os mínimos da prudência. Já a minha avó me dizia em pequenino: “não contes o teu segredo a ninguém, se tens um amigo, o teu amigo, amigos tem”…
Na verdade, quando dizemos que “entre nós não há segredos” não estamos a revelar uma relação perfeita mas, apenas, a puxar do sentido de Estado que há em cada um de nós para a credibilizar. Mais nada!
Com o Estado as coisas não funcionam assim. Já aqui vimos que o Estado e os cidadãos fazem da sua relação um jogo de gato e do rato. Cada um só pensa na maneira mais rápida e mais ágil de enganar o outro e, quando assim é, vale tudo. Ou pelo menos o segredo vale muito!
Talvez seja por isso que, achando o segredo um direito inalienável, valorizemos tanto o(s) segredo(s) de(o) Estado.
Repare-se:
- “Isso não posso revelar, é segredo de Estado”!
- “Pronto, não se fala mais disso”…
Mas se fôr:
- “Isso não posso revelar, a Maria pediu-me segredo”
- “Vá lá, deixa-te disso, conta lá”…
Se algum dos nossos amigos argumenta com o segredo, já sabe que … está feito. Não se safa dali sem se desbocar completamente. Já o homem (que me desculpem as mulheres, mas…) de Estado, quanto mais segredos invocar, mas estadista fica. Quanto mais explorar a sua condição de dono do segredo, mais pose de Estado adquire e mais sentido de Estado exala!
Não falamos da actualidade, do acontecimento. Nem opinamos sobre uma notícia.
Falamos de política num estado mais puro. Sem os seus actores principais, os políticos - o que torna o ar mais respirável. E os postais sempre actuais; por isso, com as discussões em aberto.
A discussão continua também nos postais anteriores, onde comentamos sem constrangimentos de tempo ou de ideias.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.