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Petições Públicas

por Sarin, em 24.04.20

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A propósito das comemorações do 25 de Abril surgiram petições variadas na forma e no objectivo, uma delas dirigida, entre outros, ao Primeiro-Ministro. 

O que é, afinal, uma petição?

Consagrado na Constituição da República (CRP), o Direito de Petição é o instrumento mais poderoso a que o cidadão pode deitar mão para se dirigir voluntariamente aos órgãos do Estado e obter uma resposta.

Segundo o ponto 1 do artigo 52.º da CRP,  "Todos os cidadãos têm o direito de apresentar, individual ou colectivamente, aos órgãos de soberania, aos órgãos de governo próprio das regiões autónomas ou a quaisquer autoridades petições, representações, reclamações ou queixas para defesa dos seus direitos, da Constituição, das leis ou do interesse geral e, bem assim, o direito de serem informados, em prazo razoável, sobre o resultado da respectiva apreciação."

 

Uma petição pública, podendo ser colectiva, mais não é do que um abaixo-assinado com o objectivo de exercer pressão, sensibilizar políticos, criar uma onda de indignação, alterar ou criar propostas de lei. Portanto, tudo será admissível numa petição, que pode ser promovida em forma de papel ou através de plataforma electrónica criada exclusivamente para o efeito.

Uma petição não é, de todo, um exercício do direito de voto, não é um referendo, não vincula a matéria peticionada a uma decisão conforme o número de assinaturas.

Mas uma petição, podendo versar sobre qualquer tema e tendo qualquer entidade estatal como destinatário (com excepção dos tribunais), é um documento que obriga à leitura, análise e resposta por alguém dentro da entidade a que se destina (no caso que deste holofote, o Poder Executivo). Ou seja, uma petição tem o poder de formalizar as nossas preocupações junto do Governo Central, dos Governos Regionais, das Autarquias. Daí a sua importância no âmbito da cidadania activa, participativa.

 

Assim, seja o objectivo promover uma onda de indignação ou sensibilizar para determinada matéria, talvez seja importante atender a alguns cuidados na sua elaboração, sob pena de a mesma não chegar ao destinatário pretendido ou não passar a mensagem desejada.

Legisladas pela Lei 43/90, Exercício do Direito de Petição, as petições são simples de criar e não exigem conhecimentos específicos ou domínio do português; no entanto, para que possam ter força e ser efectivamente um instrumento de pressão, convém lembrar que devem ser endereçadas à entidade desejada - de nada vale dirigir-se à Assembleia da República se a matéria é competência do Governo.

Também convém ter cuidado na sua elaboração, pois a petição, assim chamada genericamente, pode ser uma 

  • petição, apresentação de um pedido ou de uma proposta para que se tome, adopte ou proponha determinadas medidas;
  • representação, destinada a manifestar opinião contrária ou a chamar a atenção para uma situação ou acto com vista à sua revisão ou à ponderação dos seus efeitos;
  • reclamação, a impugnação de um acto;
  • queixa, a denúncia de qualquer inconstitucionalidade ou ilegalidade, bem como do funcionamento anómalo de qualquer serviço, com vista à adopção de medidas contra os responsáveis.

Podendo colocar-se no mesmo documento petições, representações, reclamações e queixas, resta saber se terão mais efeito juntas ou separadas.

Outra questão importante é o prazo da petição: a tramitação de cada uma exige a avaliação dos fundamentos, que podem implicar a entrega de documentos técnicos, a audições com os peticionários ou ao recurso à intervenção de entidades externas, pelo que a urgência na resposta ou a proximidade da data peticionada pode acabar por transformar uma petição viável num projecto perdido.

Há ainda que recordar que uma petição pode ter indeferimento liminar se for apresentada a coberto do anonimato e se do seu exame não for possível a identificação da pessoa ou pessoas de quem provém. Recordando que basta um cidadão para efectuar uma petição, bastará que este esteja identificado - pois é a este que a resposta, obrigatória, será endereçada. Também será alvo de indeferimento liminar se carecer de qualquer fundamento ou se a pretensão for ilegal, visar a reapreciação de decisões cujo recurso não é admissível ou se pretender a reapreciação de casos já anteriormente apreciados sem que sejam invocados ou tenham ocorrido novos elementos de apreciação. Se estas exigências não forem cumpridas, a petição não passará de ruído, de perda de tempo para todos os envolvidos.

 

Devo dizer que fico muito feliz quando vejo petições a circular, os cidadãos a exercerem o seu direito de manifestação usando um dos mais poderosos instrumentos, depois do voto. Gosto de ver tanta actividade.

Mas dói-me ver o objectivo e o teor de algumas petições. O pessoal que as inicia certamente não tem nada para fazer e encontrou nas petições uma boa forma de se entreter. Ou então acha que vale a pena fazer os governantes perderem tempo. Não que alguns não tenham tempo para perder, e não que alguns outros não se percam entre trabalhos que nada têm a ver com o compromisso assumido com a Nação... Mas há quem realmente se prepare e dedique à causa pública que assumiu - ao seu modo, com as suas competências, com mais ou menos sucesso, mas há. Essa história de que "os políticos não fazem nada" não está sequer em avaliação como argumento.

E, se lhes queremos dar trabalho, não acho que o melhor caminho seja facultando-lhes desculpa para que o não façam.

 

Nota: este tema, sendo transversal aos órgãos públicos, entra neste holofote pela actualidade do tema - muito se falou em petições nestes dias.

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As contas do Estado são discutidas junto com as tais Grandes Opções do Plano.

Ora, contas que são contas devem ser vigiadas - e se de um lado temos o Estado, representado pelo Governo, a propor-se gastar e receber, do outro temos o Estado, representado pela Assembleia da República, a vigiar como vai o Governo gastando e recebendo, e temos o Estado, representado pelo Tribunal de Contas, a verificar como foi gasto e recebido.

Estado, estado, estado. Então e os cidadãos? Onde estamos nesta processo de vigiar o Estado? Não apenas o dinheiro gasto mas também o tempo e a atitude daqueles a quem pagamos para gerirem a coisa pública e regularem a vida de todos nós?

Uma Democracia, pelo menos o modelo em que a nossa assenta, depende formalmente de 3 poderes: o Legislativo, o Executivo e o Judicial. Bem definidos e separados entre si. E depois surgiu um Quarto Poder, ou contrapoder como lhe chamou Thomas Carlyle, representado inicialmente pelos Órgãos de Informação e hoje por, aparentemente, qualquer indivíduo que receba gostos em barda. Cinjamo-nos aos órgãos de informação e comunicação social, pois a estes cabe o fundamental papel de escrutínio dos outros três, tão fundamental que por ele surgiu a muito famosa Liberdade de Imprensa consagrada na nossa Constituição.

Que, entre outras coisas, diz exactamente:

"O Estado assegura a liberdade e a independência dos órgãos de comunicação social perante o poder político e o poder económico (...)"

"O Estado assegura a existência e o funcionamento de um serviço público de rádio e de televisão."

"A estrutura e o funcionamento dos meios de comunicação social do sector público devem salvaguardar a sua independência perante o Governo, a Administração e os demais poderes públicos, bem como assegurar a possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião."

 

Centrada que estou no Estado, deixo a liberdade de imprensa e os privados para outra viagem; hoje quero mesmo falar do direito de sermos informados pelo Estado e do papel dos canais públicos no cumprimento desse direito.

Temos canais públicos de radiotelevisão e radiodifusão. É um facto. Mas não temos nenhum jornal generalista de distribuição nacional que seja do Estado - como se a palavra escrita não fosse importante... bom, façamos por ignorar esta diferenciação de tratamento dos canais usados para disseminar a mensagem. Não se justifica tal discriminação, mas adiante. Na verdade, o Estado tem um jornal, o Diário da República, que até está acessível íntegra e gratuitamente na internet - mas cujas notícias saem assinadas por legisladores e executivos e não por jornalistas. São notícias porque são novidade, mas são também letra de lei e por isso este jornal não está abrangido pela Lei da Imprensa. 

É expectável que, sem prejuízo da liberdade de imprensa dos privados, os canais do Estado se dediquem a cumprir os desígnios com que foram criados, conforme o art.º 53º da Lei da Televisão e Audiovisuais:

"O serviço de programas generalista de âmbito nacional dirigido ao grande público deve, atendendo às realidades territoriais e aos diferentes grupos constitutivos da sociedade portuguesa, conceder especial relevo: 
a) À informação, designadamente através da difusão de debates, entrevistas, reportagens e documentários; 
b) Ao entretenimento de qualidade e de expressão originária portuguesa; 
c) À transmissão de programas de carácter cultural; 
d) À sensibilização dos telespectadores para os seus direitos e deveres enquanto cidadãos."

Não me dedicarei a discutir os méritos da programação - a abertura de novos canais do estado veio colmatar algumas das muitas falhas que existiam, mas ainda assim há muito terreno para recuperar, especificamente no que respeita à cultura e à sensibilização para os direitos e deveres dos cidadãos. Esta sensibilização, principalmente esta, tem sido esquecida, relegada para segmentos de opinião em que a opinião passa por informação. E urge corrigir esta falta. Mas disse que não iria falar sobre a programação destes canais e por isso não falarei. 

Os canais públicos têm um problema de financiamento: se por um lado têm um dever consagrado na Constituição, logo não podem criar grelhas adequadas à competição pelas audiências, por outro não conseguem contratos publicitários da mesma dimensão dos privados porque têm audiências bem menos significativas. Falha nossa, dos cidadãos, que preferimos alimentar privados? Sim, falha nossa mas não apenas nossa. E talvez nem nossa seja a maior quota...

Não sendo competitivos, os canais estatais estão dependentes da dotação no Orçamento de Estado.

Suponho que terá sido por isso que criaram aquela taxinha muito incómoda e absolutamente incompreensível que pagamos na factura da electricidade: a taxa de audiovisual. Confesso que concordo com a taxa, seria uma forma de retirar da alçada do Governo alguma da dependência dos canais públicos. No entanto, uma taxa de audiovisual faz-me sentido na aquisição de equipamentos que possam transmitir audiovisualmente, entre televisões, rádios, sistemas de som, computadores, telemóveis, antenas, serviços de streaming, pacotes de canais e sei lá que mais. Uma taxa paga na aquisição do equipamento, proporcional à afectação do equipamento (um televisor não teria a mesma taxa que um telemóvel, nem lá perto!). Na electricidade não faz qualquer sentido! Claro que, perante esta taxa, a dotação orçamental teria que ser revista, mas o objectivo seria sempre a maior autonomia possível face ao OE, que é para isso que vejo as taxas e as prefiro aos impostos.

Além da questão financeira, há outra dependência importante dos canais do estado: a gestão.

A RTP tem uma Assembleia Geral e quatro Conselhos: o Independente, o de Opinião, o Fiscal e o de Administração. É este que tem o poder executivo, é este que na verdade manda na RTP, mas é escolhido pelo primeiro, que define também as linhas orientadoras do projecto de administração. O de Opinião, na prática, só tem servido para dar opinião sem carácter vinculativo e para indigitar dois membros para o Conselho Geral Independente, e o Fiscal faz o que fazem os outros CF - fiscaliza contas. O Conselho Geral Independente é formado por dois membros indigitados pelo  Conselho de Opinião, como disse, e por dois membros indicados pelo Governo, e depois entre eles os quatro cooptam, que é como quem diz, escolhem à sua imagem e semelhança, dois outros membros.

Todos nos lembraremos das várias polémicas sobre ingerências de ministros vários na RTP. E fizeram-no porque o tal órgão público que o Estado deve manter e cuja independência deve garantir está na dependência do Governo. Sim, é isso: o órgão de soberania que ninguém elege é o responsável pela tutela do serviço que nos deveria permitir a nós, cidadãos, aceder às informações relevantes sobre o que se vai passando no nosso país e com o nosso estado.

Sendo assim importante, não deveriam os órgãos públicos ser tutelados pela Presidência da República? Se:

a) o serviço público é concessionado e é o Governo que escolhe o concessionário,

b) a verba com que terão de definir o seu orçamento é atribuída pelo Governo,

c) o Governo nomeia dois dos quatro membros que depois escolherão os restantes dois membros do Conselho Independente, do qual sai a aprovação para o Conselho de Administração,

d) a Entidade que regula todos os serviços de comunicação social em Portugal, a ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social) é votada pela Assembleia da República...

... onde é que se consegue a tal independência de que fala a Constituição?

Não é que eu confie pouco nos políticos, não - é mesmo porque não confio nada. E a história tem-me mostrado que não é por mau feitio.

Concordo que o Estado assegure a existência de canais informativos, culturais, desportivos, lúdicos. Não o fazer significa deixar-nos inteiramente à mercê de interesses que, face ao quadro actual, são cada vez mais inescrutáveis... Não acho é que o modelo seguido seja o mais adequado à prossecução dos objectivos que lhe são atribuídos, nomeadamente o tal escrutínio a que nós, cidadãos, deveríamos ter direito independente de interesses políticos e financeiros.

 

Há um outro canal público de que geralmente nem nos lembramos: o ARtv, o canal do Parlamento. Um canal aberto onde podemos acompanhar o que se vai passando na Assembleia da República. Gosto muito deste canal. Permite-nos ver, por vezes ao vivo, o que se está a passar na casa da nossa Democracia. Mas vejo-o sub-aproveitado. Por exemplo, a programação para hoje começa às 11h e o último bloco vai para o ar às 23h. Audiências e Audições de dia 6, e está o dia feito.

Penso que seria um verdadeiro serviço de transparência e informação ao cidadão se contemplasse um serviço noticioso para divulgação de:

a) Sumário dos trabalhos do dia anterior,  entre comissões especiais e comissão de especialidade, com indicação das respectivas presenças;

b) Ordem de trabalhos para o dia;

c) Iniciativas legislativas em curso;

d) Legislação publicada em DRE no dia anterior.

Bem sei que tudo o que menciono acima se encontra disponível na internet, mas a internet é um canal distinto da radiotelevisão, e quer queiram quer não ainda há muitos info-excluídos - uns porque não têm possibilidade ou capacidade e outros porque não querem, "já não estão para isso" que as rotinas são uma opção de cada um.

O Estado não pode obrigar um cidadão a optar por um canal específico.

Mas o cidadão tem o direito de ser informado. Está lá, na Constituição.

 

 

O Estado e o cidadão, ou ... o gato e o rato!

por Eduardo Louro, em 02.02.19

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Regresso ao estafado “o Estado somos nós”. Não é que esteja obcecado com esta frase feita, é mesmo por mau feitio.

Como é que o Estado pode ser nós, ou mesmo nós poderemos ser o Estado, se não há relação mais conflituosa do que aquela que mantemos reciprocamente?

Quando numa relação entre duas partes, cada uma não pensa se não em receber o máximo e dar o mínimo, está tudo dito. Maior conflitualidade … é impossível.

O cidadão exige tudo do Estado. Tudo. Segurança, assistência, saúde, educação, justiça … da boa. Até emprego. E bem pago, de preferência. E que nunca lhe atrapalhe a vidinha. Que não o fiscalize. Nem quando vai no seu carrinho na estrada com o pezito mais pesado, nem quando foge em excesso de velocidade ao IVA ou ao IRS. Ou ao IRC da sua empresa. Ou quando lá na empresa mete a mão nos fundos europeus, e desvia o empreiteiro das novas instalações fabris, para exportar mais, para a piscina lá de casa.

E, como se vê, não está muito interessado em dar o que quer que seja.

O Estado, por sua vez, não faz muito melhor, e às vezes até parece que quer dar razão aos cidadãos que dele só querem fugir. Vai-lhes ao bolso sem dó nem piedade, e passa a vida a estudar a melhor forma de lhe apertar o cerco, sem lhes deixar escapatória, como num jogo do gato e do rato.

E quando chega a hora de retribuir, é uma chatice … Nunca há dinheiro. E quando há, está cativo. Não se lhe pode tocar!

Estado e cidadãos comportam-se mesmo como aqueles dois simpáticos animaizinhos. Muito simpáticos, mas não se podem ver!  

E ainda dizem que “o Estado somos nós”… Então não somos?

Liberdade

por Gaffe, em 29.01.19

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O limpo do teu rosto sobrepõe-se solto ao rosto dos outros.

Os homens pedem o teu corpo.
Apregoam o teu sangue nos ângulos das pedras em altar erguidas, mas maior que esta divina ferocidade insana é o sujo resignar que chega da cegueira daqueles que saciam as aras no silêncio.
Profanada vais, improvável morta.
A teus passos proporcional é a humana cobardia, a crescer com  multidões escravas dos terrores.

A morte cresce no esvair da origem.



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Não falamos da actualidade, do acontecimento. Nem opinamos sobre uma notícia.

Falamos de política num estado mais puro. Sem os seus actores principais, os políticos - o que torna o ar mais respirável. E os postais sempre actuais; por isso, com as discussões em aberto.

A discussão continua também nos postais anteriores, onde comentamos sem constrangimentos de tempo ou de ideias.





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