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Já aqui se falou do Programa de Governo, aquele que será tão mais fiel ao programa eleitoral do partido que chefia o executivo quanto mais representação este tiver na Assembleia da República - partindo do habitual pressuposto que a indigitação para Primeiro-Ministro recai sobre o representante máximo de um partido sufragado.
A criação dos cargos de Ministro e de Secretário de Estado está directamente relacionada com o Programa de Governo, pois é este que orienta todas as acções do Governo em formação - que, por sua vez, dependem mas também obrigam à constituição de uma equipa que as assuma. A generalidade dos Ministros ficará responsável por um Ministério, embora tenha havido nos quatro primeiros Governos Provisórios e no primeiro Governo Constitucional a nomeação de ministros sem funções executivas, os chamados Ministros Sem Pasta. Parece absurdo, um alto membro do poder executivo sem aparente função executiva, mas não esqueçamos que o Conselho de Ministros é um órgão colegial onde apenas os Ministros têm direito de voto.
Um Ministério é um departamento superior da administração do Estado, necessariamente com uma vasta amplitude pois tutela toda a sua área ou áreas temáticas. As secretarias de estado, por sua vez, são departamentos com uma área mais específica de intervenção, independentes entre si mas coordenados dentro de um mesmo ministério. A importância que for atribuída a cada área temática num programa de governo determinará a quantidade, a organização e, até, a nomenclatura de ministérios e secretarias.
Há ministérios aparentemente incontornáveis - hoje ninguém pensaria em criar uma equipa executiva sem um ministro das finanças ou sem um ministro da defesa... no entanto, e de acordo com o programa de acção delineado, um Ministério das Finanças pode bem ser um Ministério das Finanças e da Administração Pública, como em 2004-2005, ou Ministério das Finanças e do Plano, como entre 1978 e 1985. Já tivemos Ministérios da Habitação, Ministérios da Indústria, Ministérios do Equipamento Social, até um Ministério da Qualidade de Vida tivemos entre 1981 e 1985. Há áreas que ora dão origem a ministérios por direito próprio, como por exemplo o actual Ministério do Mar (que já o foi em 3 outros governos, 1983-1985, 1991-1995, 2015-2019), ora são (pouco?) estrategicamente consideradas em conjunto com outras, como foram o Mar (ou, mais redutor, as Pescas) e a Agricultura em diversos Ministérios:
Enfim, poderia dar muitos exemplos, mas escolhi este porque o Mar é uma das nossas maiores riquezas (somos um dos países com maior Zona Económica Exclusiva do mundo) e nem isso lhe garante lugar de destaque entre as gentes que nos têm governado.
Faz sentido que quem vai governar o país se organize como entende mais adequado ao alcançar dos objectivos que se propõe. Mas ter-se-á de alterar a nomenclatura dos ministérios para o conseguir? Cada alteração promovida tem encargos para o Estado, i.e, para nós - desde o papel timbrado e os carimbos aos muitos sistemas informáticos, logótipos, organogramas, placas de identificação dos funcionários, nas secretárias, nos gabinetes, nos edifícios, nas viaturas... a que acrescem tempos de paragem ou alterações executadas em horário extraordinário, tudo isto multiplicado por tantos gabinetes e tantos departamentos regionais quantos os existentes na Administração Pública sob tal tutela. Não é uma conta leve e só por si deveria obstar tanta mudança.
Além das alterações entre legislaturas, de quando em vez há umas remodelações governamentais com alteração dos ministros e dos próprios ministérios - como em 2013 com o XIX Governo, em que o Ministério da Economia e do Emprego de um titular voltou a ser apenas Ministério da Economia com outro titular, tendo o Emprego ido parar às mãos do Ministro da Solidariedade e Segurança Social - que, mantendo-se no cargo, passou a ser Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social. Parece que, afinal, a organização do Estado não estará apenas relacionada com o Programa de Governo mas também com os interesses de quem ocupa o cargo ou com as forças partidárias representadas no executivo. Afinal, o Programa de Governo é aprovado para a legislatura completa, ao contrário do Orçamento de Estado (aqui também se fala dele) e das Grandes Opções do Plano, que são de aprovação anual - não me parece que tenha qualquer sentido alterar a estrutura cimeira da administração pública se as suas linhas de orientação se mantêm. Mas alteraram, no XIX Governo e também no IX, por exemplo, ambos formados por coligações pós-eleitoriais.
Enfim, esta contínua alteração, além dos custos e das dores de cabeça para o cidadão que nunca sabe bem a que Ministério se dirige, apenas revela que neste cantinho à beira-mar plantado os canteiros mudam conforme o hortelão. Em 46 anos de III República, e após 6 Governos Provisórios e 22 Governos Constitucionais, apenas 7 ministérios chegaram aos dias de hoje mantendo o nome criado em executivos anteriores*: Administração Interna (desde 1974), Justiça e Saúde (desde 1983), Defesa Nacional, Finanças e Negócios Estrangeiros (desde 2005) e Economia (2013). Não existe consenso sobre a organização do poder executivo central, e este parece-me ser um problema de regime: não havendo continuidade na estrutura, poder-se-à esperar continuidade nas políticas estruturais?
* Não considerei os Ministérios criados pelo anterior executivo uma vez que o Primeiro-Ministro se mantém. Ainda assim, aponto que o Ministério do Ambiente passou a ser Ministério do Ambiente e da Transição Energética no âmbito de remodelação ministerial ocorrida em 2018, na anterior legislatura.
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