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As contas do Estado são discutidas junto com as tais Grandes Opções do Plano.

Ora, contas que são contas devem ser vigiadas - e se de um lado temos o Estado, representado pelo Governo, a propor-se gastar e receber, do outro temos o Estado, representado pela Assembleia da República, a vigiar como vai o Governo gastando e recebendo, e temos o Estado, representado pelo Tribunal de Contas, a verificar como foi gasto e recebido.

Estado, estado, estado. Então e os cidadãos? Onde estamos nesta processo de vigiar o Estado? Não apenas o dinheiro gasto mas também o tempo e a atitude daqueles a quem pagamos para gerirem a coisa pública e regularem a vida de todos nós?

Uma Democracia, pelo menos o modelo em que a nossa assenta, depende formalmente de 3 poderes: o Legislativo, o Executivo e o Judicial. Bem definidos e separados entre si. E depois surgiu um Quarto Poder, ou contrapoder como lhe chamou Thomas Carlyle, representado inicialmente pelos Órgãos de Informação e hoje por, aparentemente, qualquer indivíduo que receba gostos em barda. Cinjamo-nos aos órgãos de informação e comunicação social, pois a estes cabe o fundamental papel de escrutínio dos outros três, tão fundamental que por ele surgiu a muito famosa Liberdade de Imprensa consagrada na nossa Constituição.

Que, entre outras coisas, diz exactamente:

"O Estado assegura a liberdade e a independência dos órgãos de comunicação social perante o poder político e o poder económico (...)"

"O Estado assegura a existência e o funcionamento de um serviço público de rádio e de televisão."

"A estrutura e o funcionamento dos meios de comunicação social do sector público devem salvaguardar a sua independência perante o Governo, a Administração e os demais poderes públicos, bem como assegurar a possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião."

 

Centrada que estou no Estado, deixo a liberdade de imprensa e os privados para outra viagem; hoje quero mesmo falar do direito de sermos informados pelo Estado e do papel dos canais públicos no cumprimento desse direito.

Temos canais públicos de radiotelevisão e radiodifusão. É um facto. Mas não temos nenhum jornal generalista de distribuição nacional que seja do Estado - como se a palavra escrita não fosse importante... bom, façamos por ignorar esta diferenciação de tratamento dos canais usados para disseminar a mensagem. Não se justifica tal discriminação, mas adiante. Na verdade, o Estado tem um jornal, o Diário da República, que até está acessível íntegra e gratuitamente na internet - mas cujas notícias saem assinadas por legisladores e executivos e não por jornalistas. São notícias porque são novidade, mas são também letra de lei e por isso este jornal não está abrangido pela Lei da Imprensa. 

É expectável que, sem prejuízo da liberdade de imprensa dos privados, os canais do Estado se dediquem a cumprir os desígnios com que foram criados, conforme o art.º 53º da Lei da Televisão e Audiovisuais:

"O serviço de programas generalista de âmbito nacional dirigido ao grande público deve, atendendo às realidades territoriais e aos diferentes grupos constitutivos da sociedade portuguesa, conceder especial relevo: 
a) À informação, designadamente através da difusão de debates, entrevistas, reportagens e documentários; 
b) Ao entretenimento de qualidade e de expressão originária portuguesa; 
c) À transmissão de programas de carácter cultural; 
d) À sensibilização dos telespectadores para os seus direitos e deveres enquanto cidadãos."

Não me dedicarei a discutir os méritos da programação - a abertura de novos canais do estado veio colmatar algumas das muitas falhas que existiam, mas ainda assim há muito terreno para recuperar, especificamente no que respeita à cultura e à sensibilização para os direitos e deveres dos cidadãos. Esta sensibilização, principalmente esta, tem sido esquecida, relegada para segmentos de opinião em que a opinião passa por informação. E urge corrigir esta falta. Mas disse que não iria falar sobre a programação destes canais e por isso não falarei. 

Os canais públicos têm um problema de financiamento: se por um lado têm um dever consagrado na Constituição, logo não podem criar grelhas adequadas à competição pelas audiências, por outro não conseguem contratos publicitários da mesma dimensão dos privados porque têm audiências bem menos significativas. Falha nossa, dos cidadãos, que preferimos alimentar privados? Sim, falha nossa mas não apenas nossa. E talvez nem nossa seja a maior quota...

Não sendo competitivos, os canais estatais estão dependentes da dotação no Orçamento de Estado.

Suponho que terá sido por isso que criaram aquela taxinha muito incómoda e absolutamente incompreensível que pagamos na factura da electricidade: a taxa de audiovisual. Confesso que concordo com a taxa, seria uma forma de retirar da alçada do Governo alguma da dependência dos canais públicos. No entanto, uma taxa de audiovisual faz-me sentido na aquisição de equipamentos que possam transmitir audiovisualmente, entre televisões, rádios, sistemas de som, computadores, telemóveis, antenas, serviços de streaming, pacotes de canais e sei lá que mais. Uma taxa paga na aquisição do equipamento, proporcional à afectação do equipamento (um televisor não teria a mesma taxa que um telemóvel, nem lá perto!). Na electricidade não faz qualquer sentido! Claro que, perante esta taxa, a dotação orçamental teria que ser revista, mas o objectivo seria sempre a maior autonomia possível face ao OE, que é para isso que vejo as taxas e as prefiro aos impostos.

Além da questão financeira, há outra dependência importante dos canais do estado: a gestão.

A RTP tem uma Assembleia Geral e quatro Conselhos: o Independente, o de Opinião, o Fiscal e o de Administração. É este que tem o poder executivo, é este que na verdade manda na RTP, mas é escolhido pelo primeiro, que define também as linhas orientadoras do projecto de administração. O de Opinião, na prática, só tem servido para dar opinião sem carácter vinculativo e para indigitar dois membros para o Conselho Geral Independente, e o Fiscal faz o que fazem os outros CF - fiscaliza contas. O Conselho Geral Independente é formado por dois membros indigitados pelo  Conselho de Opinião, como disse, e por dois membros indicados pelo Governo, e depois entre eles os quatro cooptam, que é como quem diz, escolhem à sua imagem e semelhança, dois outros membros.

Todos nos lembraremos das várias polémicas sobre ingerências de ministros vários na RTP. E fizeram-no porque o tal órgão público que o Estado deve manter e cuja independência deve garantir está na dependência do Governo. Sim, é isso: o órgão de soberania que ninguém elege é o responsável pela tutela do serviço que nos deveria permitir a nós, cidadãos, aceder às informações relevantes sobre o que se vai passando no nosso país e com o nosso estado.

Sendo assim importante, não deveriam os órgãos públicos ser tutelados pela Presidência da República? Se:

a) o serviço público é concessionado e é o Governo que escolhe o concessionário,

b) a verba com que terão de definir o seu orçamento é atribuída pelo Governo,

c) o Governo nomeia dois dos quatro membros que depois escolherão os restantes dois membros do Conselho Independente, do qual sai a aprovação para o Conselho de Administração,

d) a Entidade que regula todos os serviços de comunicação social em Portugal, a ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social) é votada pela Assembleia da República...

... onde é que se consegue a tal independência de que fala a Constituição?

Não é que eu confie pouco nos políticos, não - é mesmo porque não confio nada. E a história tem-me mostrado que não é por mau feitio.

Concordo que o Estado assegure a existência de canais informativos, culturais, desportivos, lúdicos. Não o fazer significa deixar-nos inteiramente à mercê de interesses que, face ao quadro actual, são cada vez mais inescrutáveis... Não acho é que o modelo seguido seja o mais adequado à prossecução dos objectivos que lhe são atribuídos, nomeadamente o tal escrutínio a que nós, cidadãos, deveríamos ter direito independente de interesses políticos e financeiros.

 

Há um outro canal público de que geralmente nem nos lembramos: o ARtv, o canal do Parlamento. Um canal aberto onde podemos acompanhar o que se vai passando na Assembleia da República. Gosto muito deste canal. Permite-nos ver, por vezes ao vivo, o que se está a passar na casa da nossa Democracia. Mas vejo-o sub-aproveitado. Por exemplo, a programação para hoje começa às 11h e o último bloco vai para o ar às 23h. Audiências e Audições de dia 6, e está o dia feito.

Penso que seria um verdadeiro serviço de transparência e informação ao cidadão se contemplasse um serviço noticioso para divulgação de:

a) Sumário dos trabalhos do dia anterior,  entre comissões especiais e comissão de especialidade, com indicação das respectivas presenças;

b) Ordem de trabalhos para o dia;

c) Iniciativas legislativas em curso;

d) Legislação publicada em DRE no dia anterior.

Bem sei que tudo o que menciono acima se encontra disponível na internet, mas a internet é um canal distinto da radiotelevisão, e quer queiram quer não ainda há muitos info-excluídos - uns porque não têm possibilidade ou capacidade e outros porque não querem, "já não estão para isso" que as rotinas são uma opção de cada um.

O Estado não pode obrigar um cidadão a optar por um canal específico.

Mas o cidadão tem o direito de ser informado. Está lá, na Constituição.

 

 

orçamento de estado

imagen retirada daqui

 

isto de definir um orçamento não é nada fácil. tantas coisas a considerar, outras a prever e deixar aquele de lado caso hajam surpresas menos positivas.

confesso que eu não sou de grandes orçamentos. acho que elaborar um orçamento é o primeiro passo para que ele derrape. cá em casa é à antiga, tem-se faz-se, não se tem não se faz – claro, isto satisfeitas as responsabilidades (necessidades) básicas já definidas no século xx por maslow (segurança, abrigo, alimentação, saúde, educação). claro que o nosso orçamento familiar embora controlado, está a um nível positivo de estabilidade económica, quiçá assim como a alemanha.

mesmo assim, estas necessidades são satisfeitas de acordo com as receitas que se auferem no lar, que se limitam a dois [razoáveis] vencimentos (confesso que considero que seria claramente aplicável a criação de alguns impostos, como por exemplo: imposto canino sobre cocós fora da área autorizada – valor esse a utilizar para pagar a recolha dos dejetos; imposto sobre choro de bebé entre as 23h00 e as 7h00 – valor a aplicar no pagamento de cafés e suplementos energéticos para a mamã da criatura). isto é, a casa não tem piscina, o carro não é nada digno de um xeque do dubai e a menina não veste prada nem anda no colégio francês. há uma adequação do estio de vida à realidade económica existente.

pensando bem, quiçá tenha aqui um orçamento implícito. temos as receitas e temos as despesas e como no previsto na constituição portuguesa “o orçamento é elaborado de harmonia com as grandes opções em matéria de planeamento e tendo em conta as obrigações decorrentes de lei ou de contrato.”

 “o orçamento prevê as receitas necessárias para cobrir as despesas” [este, é a meu ver um mau princípio. não deveríamos definir as despesas em função das receitas? devemos ganhar para gastar ou gastar o que ganhámos?], “definindo a lei as regras da sua execução, as condições a que deverá obedecer o recurso ao crédito público e os critérios que deverão presidir às alterações que, durante a execução, poderão ser introduzidas pelo governo nas rubricas de classificação orgânica no âmbito de cada programa orçamental aprovado pela assembleia da república, tendo em vista a sua plena realização” [flexibilidade é sempre exigida, pois nem sempre as condições em que as coisas foram previstas se mantêm ao longo de um ano. por exemplo, ca em casa tínhamos estabelecido uma viagem pelo oriente, mas depois foi necessário comprar um carro de 5 lugares, porque as condições atuais o exigiam. tivemos que reorientar o dinheiro que possuíamos para a necessidade mais premente. podíamos ter recorrido ao crédito e fazer as duas coisas, mas não nos pareceu que fosse uma boa decisão tendo em conta que outras despesas poderiam surgir].

eu sei que gerir um país é mais complexo do que gerir uma casa, mas cada um na sua dimensão terá exigências semelhantes. cá em casa temos dois partidos, cada uma com 50% do poder de voto (o que é uma chatice, obriga a uma mais astuta negociação), e representamos para além de interesses próprios (aqui isso é válido) os interesses de duas criaturas (o cão e a filha) que embora não votassem em nós (um por absentismo a outra por idade), são por nós representados. sim, porque assim como o estado, aqui representamos todos os seres sob a nossa responsabilidade. eu e ele temos posicionamentos opostos (entre o capitalismo e o marxismo – sem extremismos absurdos). o que dificulta muitas vezes as negociações. mas pelo menos, em prol da estabilidade social e económica, há coisas do senso comum em que os partidos e nós por cá concordamos sem muitas quezílias.

quando se fala de dinheiro os desentendimentos são inevitáveis. basta  ver numa casa com pouco dinheiro, que está sempre sobre tensão, a fragilidade dos relacionamentos. um governo sem recursos, sobretudo económicos (reais ou potenciais) também se torna frágil. razão essa pela qual o orçamento de estado é tão importante e temido: tem o poder de fazer cair um governo! cá por casa os desentendimentos no orçamento levam a argumentação, negociação, braços de ferro, amuos e por norma ganha o mais persistente – na assembleia ganha o que está a governar, pois tudo fará para que o orçamento seja aprovado, mesmo que por vezes tenha de ceder em aspetos ou temas que não saberá muito bem como gerir – mas como sempre é a empurrar o (eventual) problema com a barriga que se governa este país em fase de votação do orçamento do estado e (um plus) em ano de eleições – e esta nota nada tem de específico com o atual governo… pois é como a páscoa, calha sempre ao domingo).

nota: todo o texto que surge entre aspas é extraído da constituição da república portuguesa, versão 2005 (artigos 105º e 106º)

O Orçamento-(eleitora)lista

por Sarin, em 09.02.19

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O Orçamento de Estado, diz a Não me dêem ouvidos e diz o Eduardo Louro, orienta, limita e obriga o Governo e as suas políticas, pois que tem de ser elaborado por este e aprovado na Assembleia.

Claro que não basta a um Orçamento ter as muitas e variadas rubricas em bonitas folhas de Excel; tem que ter algumas instruções sobre como se pretendem usar (afectar ou dotar, dizem eles) os dinheiros. Sim, dizer "que se afecta um determinado montante, ou que se dota uma determinada entidade, com um determinado valor" só por si é muito vago, apesar de todos os determinados que a frase tem; por isso, para que as ideias fiquem claras e depois não andem em guerras "ah, mas eu achava que..." é que o Governo tem de apresentar os Planos, conforme previsto na nossa Constituição. Planos que mais não são do que a resposta às velhas perguntas Como, Onde, Quando, Quem - o Quanto fica por conta do OE.

Se notarem que mal falo no Conselho Económico e Social é porque este CES está previsto ser consultado em quase tudo mas apenas ouvimos falar desta gente aquando de matéria laboral, pois que no que aos outros planos respeita aparentam entrar mudos e sair calados... e é pena.

 

Voltando aos Planos, estes são abrangentes e orientam toda a política económica do Governo em cada ano, e por isso têm um nome assim para o grandioso: Grandes Opções do Plano. Os deputados exigem saber, e muito bem!, todos os Porquês destas GOP, e depois de explicadas na Assembleia até podem propor alterações, mas nunca se podem chegar à frente com uma ou outra opçãozita... Enfim, o tal Plano é do Governo e, como disse uns postais antes, os nossos governantes nunca se descosem muito nas campanhas, até porque nem sabemos de quem se rodeará o Primeiro-Ministro; portanto, e em rigor, nunca ninguém pode acusar os governantes de não cumprirem o planeado - daí ser sempre o qualquer-PM a levar rodas de mentiroso, e aqui me penitencio desde já se nos próximos anos nascer algum que não.

Assim, o Orçamento do Estado mais não é do que uma imensa lista de despesas, receitas e investimentos apurados (tentem lá fazer isto num processador de texto!), determinados em função das GOP, as quais obedecem ao tal Plano - que se confunde quase sempre com o Programa de Governo. Isto porque em Portugal não há tradição de continuidade entre governos de cores distintas, pois era suposto o Plano ser, efectivamente, um Plano de Desenvolvimento do País, no qual o CES teria um papel fundamental como garante da continuidade; mas aquilo que se vai conseguindo nesta matéria resulta, afinal, dos tais pactos de regime.

 

Ora se o OE não passa afinal de uma lista de entradas e saídas esperadas de dinheiro, claro é que em ano de eleições a lista se torna eleitoralista - afinal, quem governa tem de tentar ser reeleito para poder continuar o seu Plano.

 

 

Orçamento (t)Estado

por Eduardo Louro, em 08.02.19

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Diria que o Orçamento Geral do Estado, mais que peça central da governação, é o pilar político-administrativo do regime.

O Orçamento não é apenas o guião da governação, um instrumento de planeamento ou a bengala política do governo. Não é apenas isso, é tudo isso. E ainda mais que isso: é a peça central da estrutura do regime. É o fiel da balança no exercício do poder democrático ou, pelo menos, nos seus mínimos da alternância democrática.

Todo ele está envolto em formalidades e prazos rígidos. Tem que ser apresentado na Assembleia da República, em forma de proposta (creio que não, necessariamente, em suporte de pen), até Outubro. Até ao primeiro dia deste mês, na lei actualmente em vigor. Dois dias depois a proposta é colocada a votação, na generalidade e, logo aí, activa o ponteiro da balança do regime. À falta de aprovação, a coisa não se faz por menos: o governo cai, com ele cai tudo à volta, e marcam-se eleições. É a bomba atómica do Parlamento, como a moção de censura. E como a outra que o Presidente guarda religiosamente em Belém.

Se tudo correr bem, quer dizer, se a maioria que suporta o governo, ou a que conjunturalmente se arrumou para o aguentar, com mais ou menos sapos engolidos, se mantiver operacional, segue-se um longo debate na especialidade, onde muitas vezes a proposta inicial é toda voltada do avesso. É sempre coisa para mais de um mês. No fim, vota-se – então sim, já o Orçamento – na especialidade, com o mês de Dezembro à porta. A tempo de ir a promulgação ao Presidente da República, e de ser publicado para entrar em vigor no primeiro dia do ano.

Porque o ano não se pode iniciar sem Orçamento. Não deve… Poder, pode, mas não há ninguém que goste muito disso. Os credores, então… Nem querem ouvir falar disso. Mas pode, o governo fica obrigado aos números do Orçamento anterior, distribuídos por duodécimos. Fica a governar por duodécimos, como muita gente gosta de dizer.

Não é drama nenhum. Mas é, de todo, de evitar. Por isso não se percebe por que é que as eleições legislativas são, de há muitos anos, marcadas para o mês de Outubro. Percebe-se que Outubro seja um bom mês. É depois das férias, e as pessoas ainda andam bem-dispostas… O clima ainda ajuda, faz bom tempo, mas as pessoas já não precisam de aproveitar todos os minutos para fugir para a praia. Mas não ajuda nada o Orçamento!

Ainda todos nos lembramos da última vez. As eleições deram no que deram, quem pensou que tinha ganho, afinal não ganhou, o tira teimas não foi fácil – se não é fácil convencer quem nunca tem dúvidas, nem quem nunca se engana, imagine-se o que seja convencer quem raramente tenha dúvidas e nunca se engane – e o governo acabou por tomar posse já no fim (dia 26) de Novembro. Quando os deputados aprovaram o programa de governo já deveriam estar a aprovar o Orçamento. Mesmo assim, podia ser bem pior, e o Orçamento para 2016 acabou por ser publicado a 5 de Fevereiro (não deve ter sido nada fácil!), com apenas um mês em regime de duodécimos.

Sendo o Orçamento o que é, tendo a centralidade que tem na vida do país, em particular na relevância que assume nas relações externas do país, e nas relações com as instituições europeias, não faz qualquer espécie de sentido manter as eleições legislativas em Outubro. Parece brincar com o fogo!

 

Impostos e taxinhas

por Sarin, em 06.02.19

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Quando pensamos em impostos, temos tendência a considerar os impostos e a taxas todos iguais porque vão igualmente para o Estado.

 

Na verdade, não é bem assim. Os impostos só podem ser criados pelas, ou com autorização das, Assembleias. É matéria do poder legislativo.

Quando um imposto, ou uma taxa, é criado, fixa-se por lei qual o seu destino, e independentemente do seu valor, é retalhado entre vários destinatários. Impostos e taxas, nascem com destino certo. Mas com objectivos distintos: um imposto é unidireccional, é uma quota que pagamos para financiar o Estado, já a taxa visa financiar ou ajudar a financiar um serviço específico que nos é prestado em troca. Mesmo que o não queiramos, o serviço é prestado. Pelo menos, é o que leio do artigo 4. da Lei Geral Tributária.

Se os impostos são uma quota de financiamento do Estado, porque haverá tantos e tão variados impostos? Não seria mais simples falar em imposto único? A incidência e a proporcionalidade do imposto, fontes de tantas brigas e angústias, são distintas, daí a miríade de impostos que se acumulam numa factura. Não quero entrar pela fiscalidade, principalmente porque estou descalça - e esse é um mundo gelado e imenso. Gelado porque unilateral, frio, sem complacência pelas dificuldades quotidianas dos cidadãos. Que tudo financiam.

 

E as taxas? As taxas financiam serviços efectivamente prestados. Que podem, aparentemente, não ser prestados efectivamente a quem a paga, mas cujos estudos de relação causa-efeito definem a elevada probabilidade de tal vir a acontecer. Por exemplo, taxas sobre determinados alimentos que comprovadamente estão ligados à elevada incidência de algumas doenças. Não me repugna o conceito de utilizador-pagador que está na origem das taxas. Estabelece-se assim uma proporcionalidade entre o serviço do Estado que usufruímos e o que por ele pagamos.

Uma taxa não deve ser confundida com o preço - o preço está associado ao custo do serviço, a taxa estará associada à sua disponibilização. Por isso, talvez, a taxa funcionar também como dissuasora ou modeladora de comportamentos.

 

E há ainda as contribuições, aplicadas em situações de excepção. Que podem não ser assim tão excepcionais!

 

 

As taxas e impostos deviam ser devidamente discriminadas no preço de bens e serviços. De todos os bens e serviços.

Para que todos soubéssemos exactamente o que pagamos e a quem. Para podermos fiscalizar, escrutinar, a acção do Estado. E para podermos perceber as conversas dos deputados sobre o Orçamento do Estado, afinal o grande motor das políticas de qualquer Governo. Dizem...

 

O Estado Social e os Impostos (I)

por Pedro Silva, em 05.02.19

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O Estado Social e os Impostos são a “arma de arremesso” preferida dos defensores da ideologia neo liberal. Os defensores desta linha de pensamento ignoram (ou fazem por ignorar) aquilo a História do Velho Continente. Se há coisa que o século XX nos demonstrou, especialmente no pós 2.ª Guerra Mundial é que o Estado Social é fundamental para a manutenção de um clima de Paz e segurança numa Europa já bastante fustigada por variadíssimos conflitos bélicos e questões regionais que estão ainda por resolver.

 

Em suma, a questão é antiga, mas é um facto que o Estado Social tem de existir. E este apenas existe porque a suporta-lo está a necessidade de Paz e Coesão Social de que falei anteriormente. Mas a criação e manutenção do Estado Social no Velho Continente implica, acima de tudo, que exista uma base financeira. Base que é gerada pelos impostos e taxas que o Estado cobra. Dito de uma forma mais simplista, não há Estado Social sem impostos. Pelo menos na Europa. Já no “Novo Mundo” e Oriente a conversa é outra dado que falamos de sociedades com ritos, história e formas de estar completamente distintas das sociedades europeias.

 

Apesar de tudo os impostos revestem duas vertentes. Não tem somente como missão apoiar e assegurar a manutenção do tão necessário Estado Social. A sua outra vertente (à qual voltarei em tempo oportuno), é a de modelação da sociedade através da regulação de sectores de actividade como é o caso do imposto sobre o tabaco, álcool, bebidas açucaradas e por aí adiante. E se olharmos somente para este aspecto podemos afirmar - com muita razão – que o valor que pagamos a título de impostos, taxas e taxinhas é, por demais, exagerado se tivermos em linha de conta a capacidade que o nosso pequeno país tem de produzir rendimentos.

 

Mas, tal como já aqui o disse, a questão do valor exagerado que nos é cobrado a título de impostos e demais taxas é uma temática à qual voltarei em tempo oportuno. O importante neste momento é que fique bem patente a extrema necessidade de se ter um Estado Social forte que seja capaz de chegar eficazmente a todos os que dele precisam sendo que para tal também é necessária uma máquina tributária que o financie.

 

O problema maior dos tempos que correm é que a quebra demográfica que se verifica no nosso país (e Europa) dado que a população inactiva começa, aos poucos, a ser parcamente superior à activa aliada à velha questão da má gestão do erário público (algo tão próprio de Portugal…), cria a ilusão, perigosíssima, de que o Estado Social é um empecilho do qual nos devemos livrar rapidamente. Para muitos a solução passa, exclusivamente, pela aposta nos variados Seguros oferecidos por empresas que, pela sua própria natureza, buscam, tão-simplesmente, o lucro. Mesmo que para tal tenham de explorar ao máximo o bem-estar de que as contrata para tal. Tal solução, na minha manifesta opinião, é contra natura e choca de frente com tudo aquilo que a Europa tem vindo a conquistar desde o término da Segunda Grande Guerra Mundial e desde o 25 de Abril em Portugal.

Regionalização (de volta)

por Eduardo Louro, em 05.02.19

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Regresso à descentralização do Estado, depois do enquadramento aqui feito há dias.

É um regresso que se deve ao tema propriamente dito mas, acima de tudo, porque fervilha autenticamente na actualidade política nacional. E, não… Não é porque o país continental, do Minho ao Algarve, está a discutir em Assembleias Municipais as competências que o governo da nação decidiu transferir do centro para a periferia do Estado. É mesmo porque, vinte anos depois, a regionalização está de volta ao centro das preocupações políticas do centrão.

Nunca seria uma boa notícia, porque essa gente que verdadeiramente dispõe do país deveria ter no centro das suas preocupações coisas realmente centrais, para o país e para os cidadãos. Coisa que a regionalização não é, e está longe de ser. É no entanto tão pior quanto se percebe estar a ser cozinhada às escondidas, assim como quem não quer a coisa para, no último momento, nos apresentarem estudos, relatórios, pareceres e afins que demonstrem à evidência que, sem o dividir em regiões autónomas, o país não vai a lado nenhum.

É verdade, a acreditar no que se pôde ler num semanário do fim-de-semana, tudo está a ser preparado até ao mais ínfimo pormenor, no mais escondido dos segredos.

Na Assembleia da República já está criada uma comissão para a descentralização. Chamam-lhe “Comissão Independente para a Descentralização”, mas é constituída gente nomeada pelos partidos, todos conhecidos pelo seu fervor regionalista. Nada melhor para lhe justificar o nome: uma comissão independente constituída por gente escolhida pelos partidos entre os que, nas suas próprias fileiras, mais acerrimamente defendem a bandeira da regionalização! 

A Freitas do Amaral, que há 40 anos anda envolvido em tudo o que é comissão sobre a matéria, e que frequentemente reclama que a regionalização é a única parte não cumprida da Constituição, foi já encomendado um estudo. Independente, já se vê.

Há meses que se sabia que os dois principais partidos do regime se tinham entendido sobre a descentralização. Não se entendiam sobre nada, mas sobre descentralização, sim, tinha sido possível um esforço de convergência. Mas só se sabia isso, que havia entendimento. Não se sabia em quê, o que angustiava muitos dos profissionais do comentário político.

Começa hoje a perceber-se. A mesa de repasto está a ficar demasiado pequena. Adivinham-se mais quatro anos de seca... E o melhor é mesmo que o Estado precise de mais Estado. Não há entendimento que falhe!

Big Brother Fiscal

por Vorph "ги́ря" Valknut, em 04.02.19

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"O caminho para o Controlo Total é paradigmático, não dependendo do lugar ou do tempo. Primeiro, indelevelmente, sem que ninguém note, limitam-se/suspendem-se liberdades, num determinado contexto social, ou político, que pareça, à população em geral, uma medida adequada (o ideal é fazer com que seja o próprio povo a exigir a restrição das suas liberdades), em nome de uma Ordem vaga, de uma Segurança diáfana, ou de uns quaisquer e vagos princípios que "Promovam a Excelência da Administração Pública"

 

Recupero, acima, o trecho de um texto, anteriormente, publicado por mim, aqui no Rasurando, tendo como propósito avaliar o Orçamento de Estado de 2019, mais concretamente em duas das suas medidas:

 

1) "A possibilidade de troca de informações entre as bases de dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional e a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS)". 

 

2) "A possibilidade de troca de informações entre bases de dados, que envolve a Agência Portuguesa para o Desenvolvimento e Coesão, instituto público responsável pela coordenação, avaliação e comunicação dos fundos europeus, nomeadamente do Portugal 2020. O OE prevê que esta Agência possa "estabelecer as necessárias interconexões de dados" com sete entidades públicas diferentes - Autoridade Tributária, Segurança Social, Instituto dos Registos e Notariado, Instituto do Emprego e Formação Profissional, Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares, Instituto de Gestão Financeira da Educação e Agência para a Modernização Administrativa.
A esta lista juntam-se "os demais serviços da administração pública cuja intervenção se afigure relevante e necessária à prossecução das referidas competências" - ou seja, qualquer um".

 

(fonte: https://www.dn.pt/edicao-do-dia/23-nov-2018/interior/protecao-de-dados-aponta-normas-inconstitucionais-no-orcamento-10213306.html)

 

 

Esta recente e crescente tendência para o Controlo Total, por parte do Estado, em nome de uma vaga, arbitrária e abrangente "Promoção da Excelência na Administração Pública" é a meu ver ilegítima, abusiva, violando, na substância, os Direitos à Protecção de Dados Individuais, de Reserva da Vida Privada e do Segredo Bancário. Aliás esta preocupação é comungada, também, pela Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), que não tendo sido consultada pelo Parlamento, considera inconstitucionais, ditas propostas, ao abrigo do Artigo 35º da Constituição:

 

1. Todos os cidadãos têm o direito de acesso aos dados informatizados que lhes digam respeito, podendo exigir a sua rectificação e actualização, e o direito de conhecer a finalidade a que se destinam, nos termos da lei.

2. A lei define o conceito de dados pessoais, bem como as condições aplicáveis ao seu tratamento automatizado, conexão, transmissão e utilização, e garante a sua protecção, designadamente através de entidade administrativa independente - a CNPD.

 

Contudo, acrescentaria ainda, serem tais propostas orçamentais inconstitucionais segundo os Artigos:

 

a)Artigo 26:

1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação.
2. A lei estabelecerá garantias efectivas contra a obtenção e utilização abusivas, ou contrárias à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias.

 

b)Artigo 34:

4. É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.

 

Ou, mesmo, segundo o Artigo 8 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia:

1. Todas as pessoas têm direito à protecção dos dados de carácter pessoal que lhes digam respeito.
2. Esses dados devem ser objecto de um tratamento leal, para fins específicos e com o consentimento da pessoa interessada ou com outro fundamento legítimo previsto por lei. Todas as pessoas têm o direito de aceder aos dados coligidos que lhes digam respeito e de obter a respectiva rectificação.
3. O cumprimento destas regras fica sujeito a fiscalização por parte de uma autoridade independente (CNPD).

 

 

Infelizmente estas propostas orçamentais vão de encontro, nos seus objectivos vagos, arbitrários, "totalitários", a outras iniciativas legislativas, relembrando, a propósito, o recente projecto de lei, apresentado pelo Bloco de Esquerda (BE), e aprovado, na generalidade, no Parlamento, que permite à Autoridade Tributária (AT) o livre acesso a todas as contas/dados bancários, sem outra causa provável, que não os montantes serem iguais ou superiores a 50.000€, pecúlio irrisório, quando se recorre ao argumentário da transparência fiscal, ou ao combate à fraude e evasão fiscal para legitimar a "justiça" do dito projecto de lei. Ou seja, e em termos práticos, qualquer cidadão que tenha amealhado a imódica quantia de 50.000€ (10.000 contos) será considerado, pela AT/Estado, como suspeito de fraude, evasão, ou, quem sabe, branqueamento de capitais, não sendo necessário para isso que haja indícios judiciais de ilícitos criminais (ver Artigo 34, da Constituição).

 

Citando, Assunção Cristas, cujo partido rejeitou, no Parlamento, a proposta de lei do BE :

 

"Para nós, quem trabalha a vida inteira e quem poupa - tantas vezes com esforço - e, no fim da sua vida, tem 50 mil euros na conta bancária não é rico nem é suspeito de cometer fraude fiscal"

 

 

 

 

 

 

 

 

Estado-Laico-ou-Estado-Ateu.png

imagem retirada do istoé

 

 

Portugal, sendo um estado laico, é um país maioritariamente cristão.

 

Portugal é um estado laico. Como já aqui foi dito, não é que esteja assim preto-no-branco na nossa Constituição, mas está na separação entre religião e estado. Está na liberdade de culto.

Enquanto nação, somo um puzzle de judeus, cristãos e muçulmanos, e embora tenhamos herança de muitas culturas, religiosamente sempre tivemos mais tendência para rezar Avés Marias e recorrer a Padres Nossos. Temos até as cinco chagas de Cristo no escudo da bandeira republicana. Tal como tivemos na bandeira da monarquia e desde Afonso Henriques, a quem Cristo terá surgido antes da Batalha de Ourique... uma pena que desde então não tenha dado grandes sinais de preocupação connosco, tendo-nos enviado antes o Espírito Santo. Mas, e talvez, por nossa tão grande culpa, que lhe voltámos as costas. Ao País, não tanto à religião.

Em 2011, dizia o Público que havia 50 confissões religiosas radicadas em Portugal.

Consultados o Pordata (que não apresenta dados sobre religião) e o INE, descubro aqui que em 2011, ano dos últimos Censos, dos cerca de 91,7% de portugueses com mais de 15 anos que se confessaram sobre religião, 88,32% bateram no peito como católicos, 3,58% prostraram-se perante outras confissões cristãs e 7,46% confessou-se sem religião, ateus assumidos ou apenas estando-se marimbando para essas coisas de deuses.  Parece que nos ficou Portugal com menos de 1% de seguidores de confissões não cristãs, o que se ajusta aos folhetos que me entram na caixa de correio apesar daquela etiqueta amarela que diz "publicidade não endereçada, aqui não, obrigada". 

Não sendo crível que tenha havido uma súbita e drástica mudança, apesar de naturais oscilações pelos que se foram e pelos que entretanto possam ter vindo, penso que poderemos afirmar que, hoje como em 2011, somos um país cristão.

Talvez por isso termos e mantermos alguns feriados católicos como feriados nacionais. Não apenas por isso, claro, mas também.

Porque a causa destes feriados reside num acordo com a Santa Sé, a Concordata, pelo qual a Igreja Católica tem privilégios especiais em Portugal. Como a Concordata será falada sob outro holofote,  interessa-me apenas aqui salientar que é também graças a este tratado que os eclesiásticos têm deveres e direitos distintos dos outros cidadãos e que existe regime fiscal especial para imóveis e actividades da Igreja.

Alto e pára o baile, que os santos estão a ser mais que a encomenda! Então mas não somos um estado laico? Será esta cedência à Santa Sé, como alguns lhe chamam, que contrariará o estatuto de estado laico que Portugal assumiu na Constituição de 1976?

Em 2015, Portugal celebrou um tratado com o Imamat Ismaili. Com regime fiscal especial, e também com direitos e deveres distintos para os seus membros com funções religiosas.

Em 2017 foi aberto ao culto em Santa Susana, Alentejo, um dos maiores templos budistas tibetanos da Europa.

Temos Cristãos católicos, Muçulmanos ismaelitas, Budistas tibetanos... e provavelmente outros, com muito menor expressão mas aparentemente com as mesmas liberdades e direitos. Então, afinal, já não será apenas a Igreja Católica a gozar tais benefícios... talvez apenas esteja entre nós há tanto tempo e seja parte tão intrincada do nosso tecido social, que nunca tenhamos tentado ver-lhes o princípio e o fim, aos seus direitos.

Porque se há uns anos não tão valentes era verdade que havia uma grande mistura entre os negócios da Igreja e os negócios do Estado, agora estão efectivamente separados - e se houver ainda uma ou outra negociata, estará refinada e misturada apenas por algum dos seus representantes. Ou dos representantes do diabo, vá-se lá saber que nisto de invocações cada um chama quem lhe der mais jeitinhos... mas, a existirem, parece que as Sedes Espirituais nada terão a ver. Pelo menos que seja público.

 

Estes estatutos especiais só são possíveis porque Portugal tem a liberdade de culto, consagrada na Constituição, como relembrou a minha cara Não me dêem ouvidos no seu postal, liberdade de culto que saiu bastante reforçada pela Lei da Liberdade Religiosa.

Vivermos num estado laico não significa, de todo, vivermos num país sem religião.

Significa apenas separação de poderes. 

As escolas têm educação moral e religiosa ministrada consoante o desejo dos pais e a disponibilidade de sacerdotes de cada confissão. Existem escolas religiosas onde, desde que mantidos os currículos aprovados pelas autoridades nacionais competentes, são seguidos ritos e são leccionadas matérias religiosas específicas desta ou daquela confissão. As forças armadas têm orientadores espirituais de várias confissões. As obras sociais particulares tanto podem ser laicas como religiosas. ...

Enfim, o Estado não proíbe os ritos e símbolos religiosos, o País pode tê-los e exibi-los de acordo com as crenças pessoais. Simplesmente, o Estado recusa-se a participar em tal exibição, deixando a cada um essa decisão.

Poderá ser feito mais por esta separação? A representatividade de cada religião é um factor importante a ter em conta - não fará sentido querer ter um monitor de religião budista numa escola apenas porque há um aluno cujos pais são budistas, por exemplo. Mas faria sentido que nas aulas de religião e moral as várias religiões fossem abordadas, explicadas, dando aos alunos hipótese de se familiarizarem com as mesmas antes de serem doutrinados? 

Penso que sim, o conhecimento nada tem a ver com doutrinação - e evitar-se-ia algum preconceito. Se bem que, como cidadã ateia num país cristão que é um estado laico, não tenho muitas queixas. Graças a Deus? Sim, claro, e Oxalá assim continuemos... Namaste!

rebanho estado

imagem retirada daqui

 

hoje acordei e pensei: há muito que não sei do nosso estado nação!

claro que me perdi de imediato no pleonasmo que poderia ser a expressão “estado nação”

o velho dr. google disse-me que o estado se “refere a qualquer país soberano, com estrutura própria e politicamente organizado” e a nação, “é uma comunidade estável, historicamente constituída por vontade própria de um agregado de indivíduos, com base num território, numa língua, e com aspirações materiais e espirituais comuns.” consegues compreender a diferença entre os conceitos?

eu tenho dificuldade, mas, segundo li, o estado controla e administra a nação, assim sendo, e trocados por miúdos, a nação abrange tudo aquilo o que nos caracteriza enquanto um povo (território, língua, história, cultura) e o estado, é o poder administrativo que gere a nação. que é como que diz que num rebanho de ovelhas, o estado é o pastor.

 

quis saber mais e fui beber da fonte de todo o saber constitucional, na bíblia da nossa liberdade: a constituição da república portuguesa. lá podemos ler, no artigo 2º, que “a república portuguesa é um estado de direito democrático, baseado na soberania popular”

aqui a coisa fica um pouco mais complexa porque temos de perceber o que é a república. de modo simples, a república é uma forma de governo em que o chefe de estado, no nosso caso o presidente, é eleito pelo povo, sendo que a sua “chefia” tem uma duração determinada.

que é como quem diz, que o pastor manda nas ovelhas, porque elas, livremente, lhe deram esse poder enquanto o entenderem. em portugal as coisas são giras porque o presidente manda mas não governa, assim como os tribunais. para isso temos o governo e a assembleia da república. estes são os fantastic four que constituem os órgãos de soberania do estado português.

surge assim, na nossa metáfora, o cão de pastoreio que auxilia o pastor na sua missão. as ovelhas precisam de um pastor para manter o seu bom funcionamento enquanto rebanho, mas é importante entender que o rebanho existirá sempre, independentemente de quem for o pastor ou os cães que o auxiliam. o estado é constante, o governo muda, consoante a vontade do povo soberano – é bom não esquecer que o verdadeiro poder de um estado democrático reside na vontade do seu povo, na nossa vontade!

 

a constituição da república data de abril de 1976, um ano após a revolução dos cravos. passados quase 43 anos há tarefas fundamentais do estado (artigo 9.º) que parecem andar a passo de caracol em dias de chuva:

d) promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais;

e) proteger e valorizar o património cultural do povo português, defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território;

f) assegurar o ensino e a valorização permanente, defender o uso e promover a difusão internacional da língua portuguesa;

 

e outros que parece que lá foram postos só porque ficavam bem no papel, mas que por lá ficaram imóveis – levantando o dedo mindinho quando a europa de vez em aquando chama por eles:

g) promover o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional, tendo em conta, designadamente, o carácter ultraperiférico dos arquipélagos dos açores e da madeira;

h) promover a igualdade entre homens e mulheres.

 

a nossa constituição é um documento lindo. o paralelismo anteriormente feito com a bíblia, pese o nosso estado pseudolaico, não foi (como sei que sabem) inocente. por vezes questiono se ambos não foram escritos por almas iluminadas em dias de grandiosas utopias ou estados de mente alterados. questiono se quem o escreveu o fez na consciência da realidade ou no seu desejo e forma de ver o mundo e a sociedade. ou quiçá ainda, na projeção do que acreditava ser o que deveria ser escrito aos olhos dos outros.

 

por outro lado, temos aqueles que, desrespeitando a beleza narrativa e utópica dos ilustres livros, os usam e manipulam para atingir os seus objeitos – nem sempre imbuídos no respeito pela cidadania.

 

enquanto que ao ler a bíblia entramos em contacto com histórias que foram escritas para moldar o nosso comportamento moral – muito à conta do conceito de pecado, e do castigo de um ditador todo-poderoso; ao ler a crp é como se lêssemos uma bela história, algo que poderia ser perfeito, mas que não é.

 

uma das histórias mais belas da nossa constituição é o princípio da igualdade (artigo13º)

1. todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.”

2. ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.

 

e qual é a vossa história preferida no mais belo livro do estado português?




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Não falamos da actualidade, do acontecimento. Nem opinamos sobre uma notícia.

Falamos de política num estado mais puro. Sem os seus actores principais, os políticos - o que torna o ar mais respirável. E os postais sempre actuais; por isso, com as discussões em aberto.

A discussão continua também nos postais anteriores, onde comentamos sem constrangimentos de tempo ou de ideias.





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